Tempo de Plantar Hortelã

Guardo histórias – descubro – umas belas, outras nem tanto.
Fabrico histórias – sei – nascidas de necessidades profundas e imaginações verdadeiras.
Fabricante de histórias, depositária de fatos, não me conformo, quero muitas vezes a verdade quando ela ainda mal nasceu. Por isso sofro.
Mas, assim de repente, do nada e do tudo, me deu esta vontade de ser feliz demais. Sei que isso é quase coisa de criança, mas me deu. Há uma alegria nova no meu peito, finalmente e depois de grandes sofrimentos. E acordo há dias de bom-humor, olhando a vida de outro jeito. Mesmo que seja quase madrugada, ainda, quando me levanto e vou para o trabalho, mesmo que eu entenda que longos são os dias que atravesso, minha tristeza hoje se chama apenas tristezinha.
Desviraram-me do avesso onde eu estava e permaneci durante muito tempo, caramujo escondido em sua própria casa: resgataram-me e pingaram no copo transparente da água da alegria as gotas certas de que eu precisava. Como se fosse uma mágica, assim nascida do nada que de repente se me fosse revelada.
Ensinaram-me o auto-resgate na estrada perigosa do viver de qualquer jeito.
Os aumentativos, hoje, me tocam.
Os plurais, os singulares, os verbos esquecidos também.
E se anuncia no ar a verdade sem contornos: deixarei de chorar inutilmente.
Desviraram-me do avesso… ainda bem.
Meus sonhos hoje são grandes mesas postas onde come todo mundo que amo, amei. Espigas de milho se misturam a uvas lustrosas, a copos plenos, toalhas de renda e xícaras de porcelana. Pães são repartidos, pratos transbordam e se oferece a vida porque o outro quer receber, percebo. Há muito eu tinha deixado de sonhar, hoje retomo os sonhos. E retomo-os enluarada, mal podendo acreditar que os retomo.
Desviraram-me do avesso, onde eu me escondia.
E quero, por Deus, como quero, desaprender a contar histórias cujas peças eram desencaixadas, soltas, de amor vazias.
Desviraram-me do avesso, repito, e com palavras que são mais que gestos. Aprendo a conjugar verbos novos, mesmo que irregulares. Aprendo fácil, rápido, me dando o luxo de rir enquanto aprendo.
E aprendi, também, por esses dias, que tudo é milagre, tudo é possível. Em pleno outono, reaprendo as primaveras esquecidas. E sei, aprendi de repente a saber, que às vezes é em pleno outono que a primavera nos faz nascer seus brotos mais perfeitos e suas flores mais bem nascidas.
Desviraram-me do avesso de tantos anos, reafirmo, e vou percebendo contornos novos.
Mesmo que se forje um arco-íris ou que se plantem nuvens, mesmo que se leiam sinais de fumaça ou mensagem dos anjos, há um tempo de perceber enigmas. E este é o meu tempo.
Tempo de estar do lado direito da vida, tempo de deixar de sofrer sem respostas. Este é meu tempo, repito, eis minha hora e vez: este é o meu tempo de plantar hortelã.